sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Projeto de CDC comentado

Amigos,

Estou trabalhando num projeto de livro do CDC comentado, inserindo sempre que possível o posicionamento do STJ e doutrinadores pátrios.

Abaixo segue o comentário ao artigo segundo do Código.

Gostaria da opinião dos amigos quanto a clareza, objetividade e facilidade de compreensão.

Agradeço desde já a atenção!



        Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
        Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.

Para a caracterização de relação jurídica de consumo é preciso que seja entabulada uma relação entre um consumidor e um fornecedor e entre eles sejam negociados produtos e/ou serviços, além das hipóteses legais de equiparação (Art. 2°,parágrafo único, art. 17 e art. 29). Ou seja, existe uma definição de consumidor padrão, uma relativa à coletividade que são “todos que estejam expostos às práticas dos fornecedores no mercado de consumo”[1], outra equiparando as vítimas de acidentes de consumo que são as pessoas que, mesmo sem ter qualquer negócio celebrado com os fornecedores, são consideradas consumidoras pelo simples fato de terem sofrido danos decorrentes da atividade do fornecedor no mercado de consumo e, por fim, as pessoas expostas às práticas comerciais, cuja finalidade maior é combater abstratamente as deslealdades dos fornecedores através de ações coletivas, evitando que os consumidores sofram lesões. Neste sentido, são considerados consumidores, por exemplo, aqueles que assistem à peças publicitárias (ofertas) ou estejam negociando contratos de consumo, mesmo antes da efetiva celebração de qualquer negócio.
Outra questão de relevo na doutrina e jurisprudência é interpretação do conceito jurídico de consumidor padrão, o qual tem algumas controvérsias quanto à interpretação da locução destinatário final. Três são as correntes ou teorias: a finalista, a maximalista e a finalista mitigada. A finalista é uma interpretação restritiva a qual não considera consumidor aquele que adquire ou utiliza o produto/serviço com finalidade econômica ou como insumo, como o advogado que adquire uma impressora para si e a utiliza como imprimir suas petições. Já a maximalista é extensiva, pois considera como consumidores todos aqueles que retiram o bem do mercado, os destinatários fáticos do produto[2]. Por fim, a finalista mitigada é uma terceira via que vem sendo construída pela jurisprudência a partir da interpretação harmônica dos princípios do CDC aplicada aos casos concretos. O Superior Tribunal de Justiça – STJ adota o critério finalista mitigado[3], também chamado de finalismo aprofundado[4], onde parte-se da interpretação finalista e se analisa no caso concreto se há vulnerabilidade do adquirente para só assim considerá-lo como consumidor, pelo que o STJ “[...] adota a teoria finalista para o conceito de consumidor, com o abrandamento desta teoria na medida em que admite a aplicação das normas do CDC a determinados consumidores profissionais, desde que seja demonstrada a vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica. [...] (Excertos do REsp 1190139/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/12/2011, DJe 13/12/2011), bem como entende que  “[..] na hipótese em que produto ou serviço são utilizados na cadeia produtiva, e não há considerável desproporção entre o porte econômico das partes contratantes, o adquirente não pode ser considerado consumidor e não se aplica o CDC, devendo eventuais conflitos serem resolvidos com outras regras do Direito das Obrigações. [...]" (Excertos do REsp 836.823/PR, Rel. Min. SIDNEI BENETI, Terceira Turma, DJ de 23.8.2010).
Desde 2005[5] defendemos a interpretação ampliada do conceito de consumidor afirmando que alguns operadores do direito tendem a prender-se demasiadamente a locução destinatário final e, por vezes, excluem do conceito de consumidor pessoas naturais ou jurídicas que utilizam produtos ou serviços adquiridos no mercado de consumo pelo simples fato de utilizarem os mesmos na consecução de seus objetivos profissionais, o que é um palmar equívoco.



[1] MIRAGEM, Bruno. p. 88. BENJAMIN, Antônio Herman V; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor, São Paulo: RT, 2010. p. 87.
[2] BENJAMIN, Antônio Herman V; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor, São Paulo: RT, 2010. p. 85.
[3] Sobre a aplicação ou não do CDC, vide os seguintes precedentes: REsp 1196951/PI, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 14/02/2012, DJe 09/04/2012; REsp 814.060/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 06/04/2010, DJe 13/04/2010; REsp 932.557/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 07/02/2012, DJe 23/02/2012; REsp 782.852/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 07/04/2011, DJe 29/04/2011; REsp 982.492/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 27/09/2011, DJe 17/10/2011; REsp 1155200/DF, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, Rel. p/ Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/02/2011, DJe 02/03/2011; REsp 1046241/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/08/2010, DJe 19/08/2010; AgRg no Ag 961.132/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/06/2010, DJe 05/08/2010.
[4] MIRAGEM, Bruno. Curso de Direito do Consumidor. São Paulo: RT, 2010. p. 94.
[5] CALADO, Vinicius, Manual Básico de Direito do Consumidor. Recife: IPEDIC,2005. 2005. p. 22.

Um comentário:

Gláucio Veras disse...

Prezado Vinícius.

Li atentamente a amostra do seu futuro livro, e achei ótima.
O tema, por sí só (Direito do Consumidor) é uma verdadeira "cachaça" - pelo menos, para mim - inclusive até pelo fato de existir profunda interação com o direito envolvido nos planos de saúde - onde procuro atuar sempre que posso. Parabéns e grande abraço. Gláucio Veras